Uma vez que a alimentação perfaz mais da metade do custo de produção do leite, as propriedades leiteiras estão cada vez mais de olho em fontes alternativas de energia para alimentação de bovinos leiteiros, principalmente para substituir o milho, alimento tradicionalmente utilizado em muitas fazendas.
É possível substituir o milho na dieta de vacas leiteiras?
Dependendo do tipo de alimento a ser utilizado, este pode substituir o milho parcialmente ou mesmo integralmente. Entretanto, alguns alimentos, dependendo do nível de substituição, não podem proporcionar o mesmo nível de produção de leite, dadas as peculiaridades de cada ingrediente.
O componente presente no grão de milho que fornece energia é o amido. Várias alternativas estão disponíveis para substituir a energia na dieta, mas substituir o amido é difícil. Do ponto de vista nutricional, um nutriente somente deveria ser substituído por outro ingrediente de igual ou melhor valor nutricional.
Entretanto, quando estudos de desempenho comprovam o efeito e a eficiência de fontes de energia alternativas com menor valor nutricional, um estudo avaliando preço do produto e o desempenho animal esperado pode ser o principal balizador para a tomada de decisão em utilizar uma fonte de energia diferente do milho grão (amido).
Nos últimos anos, essa substituição vem sendo muito discutida no exterior, visto que muitos países destinam boa parte do milho produzido para a fabricação de etanol. Com as leis incentivando o uso de energia limpa e renovável, espera-se que cada vez mais se aumente a participação do etanol com fonte de combustível.
Por sorte, o Brasil produz etanol a partir da cana-de-açúcar, o que nos permite utilizar o milho na alimentação animal de forma mais intensa. Entretanto, à medida que passar a faltar milho no mercado externo, os preços praticados no mercado interno tenderão a subir, obedecendo a lei da oferta e da procura.
O preço do milho só não aumentaria caso outras fontes alternativas de combustíveis como hidrogênio, metano, eólica, solar e nuclear fossem intensificadas, reduzindo assim a demanda do produto para fabricação de etanol.
Por outro lado, o milho utilizado para a produção de etanol também gera subproduto passível de ser utilizado na alimentação animal, os grãos destilados (DDG), subprodutos provenientes da utilização do grão de milho para produção de etanol.
Cuidados ao substituir o milho na dieta de bovinos
Alguns cuidados devem ser tomados ao substituir o milho por outro produto, pois dadas as composições de cada alimento, os níveis de amido, proteína bruta e fósforo poderão variar consideravelmente, conforme apresentado na Tabela 1.
Tabela 1. Valor nutritivo de alimentos alternativos ao milho passíveis de serem utilizados na alimentação animal.
Um bom guia é substituir somente metade da proteína do farelo de soja por outras fontes de proteínas, como por exemplo farelo de algodão, grãos destilados ou resíduo de cervejaria. Procure limitar o uso de grãos destilados em 10% a, no máximo, 20% da matéria seca da dieta e avalie o teor de gordura do leite.
Outra dica interessante é sempre que possível mandar fazer uma análise bromatológica do alimento alternativo, pois dependendo do produto, grandes variações de composição podem ocorrer. Também, uma avaliação é importante para chegar possível presença de aflatoxinas e demais micotoxinas.
Veja, a seguir, alguns alimentos que podem ser utilizados como fontes alternativas de energia em dietas de bovinos leiteiros.
O que pode substituir o milho na dieta de bovinos?
Muitos alimentos podem ser utilizados como fontes alternativas de energia em substituição ao milho e vamos tratar de alguns neste artigo. Clique nos links abaixo para ir diretamente para a seção do artigo correspondente a cada alimento:
- Sorgo
- Milheto
- Resíduo úmido de cervejaria
- Polpa cítrica peletizada
- Casca de soja
- Farelo de amendoim
- Raspa e farelo de mandioca
- Farelo de trigo
- Caroço de algodão
A decisão sobre qual produto escolher deve ser sempre pautada basicamente em dois pilares mestres: preço dos insumos e desempenho reprodutivo e produtivo dos animais.
Sorgo na alimentação de bovinos
Características nutricionais do sorgo
Embora a safra nacional de sorgo seja bem inferior à safra nacional de milho, a oferta de sorgo vem crescendo ultimamente, sendo um dos seus grandes atrativos o preço inferior ao do milho.
Assim como o milho, o sorgo é um cereal rico em amido (65 a 72% da MS), com teor de proteína bruta (PB) (11,6%) e de fibra (10,9%) pouco superiores ao do milho. Entretanto, o NDT (Nutrientes Digestíveis Totais) do sorgo é geralmente inferior ao do milho, em torno de 90% do valor do último.
O menor valor energético do sorgo em relação ao milho se deve à menor digestibilidade do amido deste cereal. Em comparação ao milho, cevada, trigo e aveia, o sorgo é o cereal que apresenta o amido menos digestível.
Isto se deve a uma maior presença de matrizes e corpos proteicos revestindo os grânulos de amido do sorgo em comparação aos demais cereais. Devido a esta peculiaridade, o sorgo é o que mais se beneficia de processamentos mais intensos como a floculação.
No Brasil, a principal forma de processamento é a moagem. Neste caso, a moagem fina é indicada em relação a moagem mais grosseira.
Desempenho de vacas leiteiras alimentadas com sorgo
Os estudos indicam que o sorgo processado na forma seca (moagem ou laminação) é realmente inferior ao milho, quando fornecidos para vacas leiteiras e para bovinos de corte.
A produção de leite é inferior para o sorgo moído ou laminado quando o consumo da dieta não é alterado por este cereal em comparação ao milho, processado da mesma forma. Produções similares têm sido relatadas, porém neste caso o consumo das dietas com sorgo tem sido superior as dietas com milho, resultando em pior eficiência alimentar.
Quando processado de forma mais intensa, no caso por meio da floculação, o sorgo tem se mostrado superior ao milho moído ou laminado para vacas leiteiras e é igual ao milho floculado. A ensilagem de grãos úmidos é vantajosa em relação ao processamento seco como a moagem ou laminação, resultando em maior digestibilidade do amido e maior NDT do cereal.
Milheto na dieta de vacas
Características do milheto como fonte de energia
A safra nacional de milheto ainda é pequena e localizada, uma vez que é basicamente cultivado no Brasil Central na safrinha. Entretanto, o milheto tem sido cultivado em muitas regiões semiáridas, onde outras culturas não se desenvolveriam bem, devido às condições desfavoráveis de solo e clima.
A proporção do gérmen do grão de milheto é duas vezes maior que do sorgo, um fator que contribui para seu alto valor nutritivo. Possui quantidades de extrato etéreo e proteína maiores que do milho e sorgo, com melhor perfil de aminoácidos (maiores concentrações de lisina, metionina e triptofano).
Entretanto, este teor mais elevado de lipídeos pode afetar sua qualidade, quando armazenado após a moagem. O teor de proteína do grão de milheto varia de 8,8 a 20,9% de proteína bruta (média de 16%), de acordo com os híbridos e manejo da cultura.
Outro ponto a ser considerado é o teor de ácido fítico de grãos de milheto não processados, sendo um fator anti-nutricional com importante influência no valor nutritivo do grão, por ser prejudicial na atividade de enzimas proteolíticas.
Desempenho de vacas leiteiras alimentadas com milheto
Trabalhos comparando o milheto a outros cereais para vacas leiteiras são menos comuns na literatura internacional e nacional. Muito embora, o que se observa é uma manutenção da produção de leite, produção e teor de gordura do leite e produção de proteína do leite à medida que se inclui milheto na dieta, como se observa na Tabela 2.
Tabela 2. Efeito da inclusão de milheto na dieta de vacas leiteiras sobre a produção e composição do leite.
1 % de inclusão do amido do milheto em relação ao amido do milho. Fonte: Ribeiro, 1999.
Resíduo úmido de cervejaria para vacas leiteiras
Características nutricionais do resíduo de cervejaria
O resíduo úmido de cervejaria (RUC) é o subproduto gerado pela indústria após o amido dos grãos de cereais ser removido para a produção de álcool. Na fabricação de cerveja, os grãos de cevada sofrem germinação para converter amido em dextrina e açúcar, processo este que é interrompido, por meio de aquecimento, no ponto máximo de conversão, resultando no produto denominado “malte de cevada”.
O malte de cevada é moído e pode ser misturado com milho, arroz, ou outros cereais, processo após o qual é feito o cozimento e separação das frações sólidas e líquidas. A fração líquida é fermentada para produzir cerveja, enquanto a parte sólida é o resíduo de cervejaria.
Antes da comercialização, o RUC pode ser prensado para remover parte da água, resultando num produto que contém de 25 a 30% de matéria seca, ou pode ser secado até 8 a 12% de umidade, resultando então no resíduo seco de cervejaria (RSC). Os teores de proteína e de nutrientes (excluindo o amido) são concentrados no resíduo, em comparação com o cereal do qual se originou.
O RUC é um subproduto disponível em grandes quantidades nas indústrias cervejeiras no mundo todo. Existem estimativas de que, para cada 1000 litros de cerveja, são produzidos 350 kg de RUC (13% MS), gerando grande quantidade de resíduo que pode ser usada na alimentação animal. A utilização normalmente é limitada às proximidades das fábricas, em função do custo do frete.
A proporção de malte de cevada, utilizada com arroz ou milho, varia entre as indústrias, e a proporção exata faz parte do segredo industrial. Esta variação na proporção de grãos resulta nas diferentes composições nutricionais observadas neste subproduto. A composição bromatológica da matéria-prima e de diversos resíduos úmidos de cervejaria pode ser observada na Tabela 3.
Tabela 3. Composição do Resíduo Úmido de Cervejaria.
1Adaptado de LIMA, 1993
2Valores do NRC (2001)
3Adaptado de Chandler, 1987
Valores expressos em % matéria seca
Desempenho de vacas leiteiras alimentadas com resíduo de cervejaria
A compilação de sete estudos comparando o RUC com a combinação de milho e farelo de soja apontou que o consumo não foi afetado pelo fornecimento de RUC. A produção de leite e o teor de proteína não foram alterados em seis, sendo que em um a produção de leite foi aumentada e o teor de proteína reduzido.
A Tabela 4 apresenta um estudo conduzido no Departamento de Zootecnia da ESALQ\USP onde avaliou a inclusão de 10% de RUC na MS da dieta, em substituição na mesma proporção a mistura de milho, polpa cítrica e farelo de soja e a inclusão de 20% de RUC em substituição à silagem de milho (10% da MS da dieta) e a mistura de concentrado (10% da MS da dieta).
Tabela 4. Teores de resíduo úmido de cervejaria na dieta de vacas leiteiras confinadas.
Fonte: Imaizumi et al., 2002.
Probabilidade de haver (1) efeito linear entre os tratamentos 0, 10 e 20; (2) efeito de desvio da linearidade entre os tratamentos 0, 10 e 20; (3) efeito do contraste entre as médias dos tratamentos 0 e U. NS = não significativo (P>0,15).
Assim, mantendo as dietas com mesmo teor de volumoso e de proteína bruta, a produção e composição do leite não são afetadas pela inclusão de RUC. Entretanto, quando parte do volumoso é substituído, a produção de leite e o teor de proteína são aumentados, enquanto o teor de gordura é reduzido.
Polpa cítrica para dieta de vacas
Características nutricionais da polpa cítrica
A polpa cítrica é um subproduto da fabricação de suco concentrado – principalmente de laranja e em menor escala de limão – pela indústria citrícola, obtida após duas prensagens dos frutos, que reduzem a umidade a 65-75%.
Posteriormente o material é seco a 100-116ºC, até que se atinja um teor de matéria seca (MS) ao redor de 88-90% e então é peletizada. O resultado é um subproduto constituído de cascas, sementes, bagaço e frutas descartadas.
Devido à sua alta capacidade de reter umidade, a polpa cítrica exige alguns cuidados para a sua armazenagem na fazenda. Locais secos e bem ventilados permitem armazenar o produto por períodos longos de até seis meses sem problema. É fundamental que o material seja checado periodicamente. Em caso de aquecimento, deve-se espalhar a polpa imediatamente para evitar combustão.
A polpa cítrica é rica em pectina, um carboidrato de alto valor nutricional, porém com alta capacidade de reter água e que dificulta a secagem da polpa. Para facilitar a secagem, é adicionado antes da prensagem 0,3 a 0,6% de hidróxido ou óxido de cálcio.
Dessa forma o produto é rico em cálcio e pobre em fósforo, o que requer cuidados especiais na formulação da dieta, quando este subproduto é usado em substituição aos grãos de cereais como milho e sorgo, pobres em cálcio e adequados em fósforo.
Apesar do Brasil ser o principal produtor mundial, até meados de 1993 o produto era quase desconhecido para a pecuária nacional. A principal razão residia no fato de que a polpa cítrica peletizada, desde o início da década de 70 era exportada quase que integralmente para a Europa (95-97% da produção), sendo empregada como ingrediente de ração para bovinos.
No entanto, em meados de 1993, o produto sofreu uma queda nas cotações internacionais em virtude de menor demanda, o que obrigou as indústrias esmagadoras a direcionarem parte da produção para o mercado interno.
Desde então, a polpa de citros peletizada consolidou-se e vem conquistando cada vez mais seu espaço no mercado interno, não só pelo trabalho de divulgação exercido por técnicos e revistas especializadas, como também pelas qualidades nutricionais deste alimento e seu custo competitivo com o milho.
Além do fato de que a sua época de produção é extremamente favorável, com a safra sendo iniciada em maio e terminando em janeiro, coincidindo com a entressafra de grãos, como o milho e sorgo. Desta forma os produtores de leite ou corte contam com um importante suplemento energético exatamente nos meses em que o milho atinge cotação máxima.
Com base nos dados de composição bromatológica, tem-se atribuído à polpa de citros peletizada um valor energético ao redor de 85-90% do valor do milho e menor teor em proteína bruta. Deve ser considerado um alimento concentrado energético, porém, apresenta características sob o aspecto de fermentação ruminal que a colocam como um produto intermediário entre volumosos e concentrados.
Quando comparada ao milho, a polpa de citros peletizada é um material com teor muito baixo de amido em sua composição, com valores entre 0,1 e 0,14% e alto teor em FDN, com 24,2% da MS. Entretanto, a fração fibrosa da polpa cítrica tem apenas 1% de lignina e é quase totalmente degradada no rúmen. Outra característica importante a ser mencionada é o seu alto teor de carboidratos solúveis ao redor de 25 a 35% da.
Além de possuir alto teor de carboidratos solúveis e parede celular altamente digestível, a polpa cítrica apresenta em sua composição um carboidrato denominado pectina (25% MS), constituído por polímeros de ácido galacturônico e que fazem parte da estrutura da parede celular dos vegetais.
A pectina é um carboidrato estrutural com alta degradabilidade ruminal (90-100%), sendo invariavelmente o carboidrato complexo de mais rápida degradação ruminal, apresentando taxas entre 30 a 50% por hora.
A fermentação da pectina é peculiar, gerando grande quantidade de energia por unidade de tempo, como ocorre com o amido e açúcares, porém com fermentação acética, que caracteriza a celulose e a hemicelulose, reduzindo os riscos de acidose.
Em comparação com o amido, a pectina possui menor propensão em causar queda de pH ruminal, pois sua fermentação ruminal favorece a produção de acetato e não lactato e propionato como a fermentação amilolítica.
Em dietas para vacas leiteiras de alta produção, na qual a parcela de alimentos concentrados é elevada, pode haver deficiência de fibra ou excesso de carboidratos não fibrosos com efeitos deletérios na manutenção da motilidade ruminal e estímulo à ruminação.
Dietas contendo silagem e grãos de milho ou sorgo podem conter teores de amido entre 25 a 33%. Estes teores podem resultar em produção de leite com teores baixos de gordura. A substituição parcial dos cereais como milho e sorgo por polpa cítrica peletizada na dieta, eleva o teor de fibra, reduz o teor de amido e ainda mantém adequada disponibilidade de carboidratos degradáveis no rúmen.
Esta prática pode gerar um efeito desejável em dietas de vacas em lactação. Isto ocorre basicamente pela redução na queda do pH ruminal devido à fermentação acética em substituição à fermentação láctica e pela capacidade de tamponamento ruminal da pectina.
Portanto, a maior disponibilidade de ácido acético (precursor da gordura do leite) e melhor ambiente ruminal propicia condições para a elevação do teor de gordura do leite quando a polpa cítrica é introduzida na dieta em substituição parcial aos grãos de cereais ricos em amido.
Quando a polpa cítrica é incluída na dieta, há a necessidade de se utilizar suplementos minerais distintos dos tradicionalmente usados, em função do alto teor de cálcio e baixo de fósforo deste subproduto. A não adequação dos teores de fósforo na dieta resultará em desempenho ruim tanto de vacas leiteiras como de animais em crescimento.
Outro problema que pode ocorrer é a redução na absorção de microminerais como zinco, devido ao alto teor de cálcio na dieta. A suplementação com doses mais altas de zinco, cobre e selênio é recomendada quando a polpa cítrica é usada em doses elevadas na dieta.
Desempenho de vacas leiteiras alimentadas com polpa cítrica
Nas Tabelas 5, 6 e 7 estão sumarizados alguns trabalhos realizados recentemente no Brasil, para avaliar a substituição parcial do milho (50%) por polpa cítrica peletizada na dieta de vacas leiteiras mantidas em confinamento com silagem de milho ou em pastagens tropicais.
Tabela 5. Efeito da utilização de polpa cítrica na produção de leite (kg/animal/dia).
*Leite corrigido para teor de gordura igual a 3,5%; Letras diferentes na mesma linha referem-se a médias que diferem significativamente entre si.
Com base nos dados, vacas com produção entre 13 a 22 kg de leite/dia, a utilização de polpa cítrica peletizada não afetou a produção de leite. Para vacas com produções desta ordem, os programas de formulação de ração parecem subestimar o valor energético da polpa cítrica em relação ao milho. Neste caso estes alimentos têm valor energético similar.
Tabela 6. Efeito da utilização de polpa cítrica nos teores de gordura do leite (%).
Tabela 7. Efeito da utilização de polpa cítrica nos teores de proteína do leite (%).
No trabalho de Carmo, com vacas produzindo ao redor de 30 kg de leite/dia, houve redução na produção quando a polpa substituiu 50% do milho na dieta. Entretanto, quando a polpa substitui 33% do milho, a produção foi numericamente superior à dieta exclusiva com milho.
Os teores de gordura podem ser aumentados com a inclusão de polpa, quando estes se apresentam baixos nas dietas com milho. Os teores de proteína bruta são levemente reduzidos com a inclusão de polpa cítrica na dieta.
Casca de soja na dieta de bovinos
Características nutricionais da casca de soja
A produção nacional de soja é bastante expressiva, sendo o Brasil um dos maiores produtores mundiais. Do processamento da soja para extração do óleo, gera-se dois subprodutos de grande importância na alimentação de bovinos, o farelo de soja e a casca de soja.
A casca passa por um processo de tostagem para inativar a enzima urease e posterior moagem para aumentar a densidade do material. Cada tonelada e soja moída para a extração do óleo gera em média 183 kg de óleo, 733 kg de farelo 48% e 50 kg de casca (5%).
A casca de soja é composta principalmente de fibra, que tem pouco valor na alimentação humana e no uso industrial. No entanto, suas características físico-químicas, a facilidade de aquisição em algumas regiões e seu preço competitivo, fazem dela um alimento interessante para o gado leiteiro.
Além do que, pode contribuir para um ambiente ruminal mais favorável para a digestão de fibra e menor risco de acidose ruminal. Alternativamente, a casca de soja pode ser usada como uma fonte de fibra em substituição parcial ao volumoso.
Em parte, o valor nutricional da casca de soja para ruminantes é determinado pela natureza química da casca. Como para muitos outros subprodutos, a composição química da casca de soja varia muito entre as indústrias processadoras.
A fração fibrosa da casca de soja, que contém relativamente grande quantidade de celulose (aproximadamente 43% da MS) e hemicelulose (aproximadamente 18% da MS), é muito pouco lignificada (1,4 a 4,3%).
O teor de amido tem variado de 0 a 9,4% com valores médios de 3,6% e os teores médios de pectina têm se situado em torno de 12,8% da MS. Outras características podem ser observadas na Tabela 8.
Tabela 8. Composição bromatológica da casca de soja segundo várias fontes.
1 – NRC (2001); 2 – Hinders (2000);
O valor nutricional da casca de soja é afetado pela taxa com que é digerida no rúmen e pela taxa com que ela passa pelo rúmen para os outros compartimentos do trato gastrintestinal. Dados de experimentos in situ e in vitro mostram que os microrganismos ruminais são capazes de fermentar extensivamente a casca de soja.
Em sete de cinco estudos a fração fibra em detergente neutro (FDN) da casca de soja foi fermentada com uma taxa média de 5,6%/h e, em quatro estudos, o desaparecimento de FDN foi em torno de 90% após 96 horas de incubação.
Desempenho de vacas leiteiras alimentadas com casca de soja
Avaliando-se o desempenho de vacas leiteiras e a substituição do milho pela casca de soja, em 13 de 15 estudos não houve diferença no consumo de animais alimentados com dietas controle, comparados àqueles que receberam casca de soja.
A correlação entre produção de leite e a porcentagem de casca de soja na dieta em 10 estudos foi baixa e não significativa. O teor de gordura do leite não se correlacionou com a concentração de casca de soja na dieta, ou com o teor de FDN provindo da casca de soja, em 10 dos estudos revisados.
A substituição de grão de cereais por casca de soja diminuiu o teor de proteína do leite. Esta resposta pode parcialmente ser explicada pelo baixo teor de carboidratos não estruturais em dietas que contém altos níveis de casca de soja, podendo limitar a síntese de proteína microbiana no rúmen.
Embora a substituição parcial ou total do milho moído fino por casca de soja possa não afetar o consumo e a produção de leite, estudos tem demonstrado que a eficiência alimentar (LCG 3,5%/CMS) foi maior nas dietas contendo casca de soja, conforme apresentado na Tabela 9.
Esses dados mostram a possibilidade de redução nos custos de alimentação de vacas de bom potencial de produção, com a substituição parcial ou total do milho por casca de soja em dietas contendo silagem de milho como volumoso e polpa cítrica como concentrado energético.
Tabela 9. Substituição de milho moído fino por casca de soja.
CS 0= 20% milho moído fino; CS 10= 10% milho moído fino + 10% casca de soja; CS 20 = 20% casca de soja; Pr>F= probabilidade de haver efeito significativo entre os tratamentos (análise de contrastes); EPM= erro padrão da média; LCG 3,5= leite corrigido para teor de gordura igual a 3,5%; IMS= ingestão de matéria seca; NUL= nitrogênio uréico no leite. Fonte: Pedroso et al. (2004)
A casca de soja, quando incluída em dietas contendo silagem de milho como volumoso, em substituição a polpa cítrica peletizada, apresentou valor nutricional similar ao da polpa cítrica, conforme pode ser observado na Tabela 10.
Tabela 10. Graus de moagem do milho e fonte de subproduto para vacas leiteiras.
MFPC= milho moído fino + polpa cítrica; MGPC= milho moído grosso + polpa cítrica; MFCS= milho moído fino + casca de soja; MGCS= milho moído grosso + casca de soja; P=F= probabilidade de haver efeito significativo entre os tratamentos; EPM= erro padrão da média; GR= efeito de granulometria (milho moído fino vs. moído grosso); FN= efeito de fonte (polpa cítrica vs. casca de soja); GRxFN= efeito da interação granulometria x fonte; LCG 3,5= leite corrigido para teor de gordura igual a 3,5%; IMS= ingestão de matéria seca; NUL= nitrogênio uréico no leite; NUP= nitrogênio uréico no plasma. Fonte: Carmo et al., 2004.
Em estudo realizado com vacas a pasto (Tabela 11), a produção de leite não foi afetada.
Tabela 11. Produção e composição do leite de vacas alimentadas com casca de soja.
Fonte: Martinez et al, dados não publicados.
Médias seguidas de mesma letra na linha não diferem entre si pelo teste de Tukey a 0,05.
1Produção de leite (3,5% de gordura) = 0,4324*PL(kg)+16,216*gord(kg) (Tyrrel & Reid, 1965);
2Erro padrão da média;
3Probabilidade
Farelo de Amendoim para vacas
Características nutricionais do farelo de amendoim
Já há algum tempo existe algum interesse sobre a utilização do farelo de amendoim na alimentação de bovinos. Entretanto, os trabalhos sobre utilização desse subproduto em rações de bovinos leiteiros são poucos.
O farelo de amendoim tem valor nutricional superior ao do farelo de algodão e características bastante semelhantes às do farelo de soja (Tabela 5), mas sua fração proteica possui degradabilidade ruminal bem mais elevada que a do farelo de soja.
Tabela 12. Avaliação bromatológica do farelo de amendoim.
1Laboratório de Bromatologia – ESALQ/USP (média de 3 análises)
2Goes et al. (2004)
3Valores da tabela do NRC (2001)
Essa maior degradabilidade ruminal do farelo de amendoim impõe aos nutricionistas duas dificuldades. Em primeiro lugar, limita a utilização de ureia em rações com esse subproduto, já que boa parte da PDR (proteína degradável no rúmen) do farelo de amendoim é composta por NNP (nitrogênio não proteico).
Desempenho de vacas leiteiras alimentadas com farelo de amendoim
Fazendo uma simulação no NRC (2001), ao formular uma ração para uma vaca produzindo 20 kg leite/dia, consumindo 9 kg MS de cana, 1,4 kg MS de farelo de algodão, 2 kg MS de farelo de soja, 1,8 kg MS milho, 1,5 kg MS polpa cítrica, 100g de uréia e 340g de minerais, conseguimos atender corretamente a suas necessidades de PDR (sobra de 24 g/d).
No entanto, se tentarmos substituir o farelo de soja pelo farelo de amendoim, haverá sobra de 240g PDR/dia (10 vezes mais), o que só conseguimos acertar reduzindo a ureia para 20 g/dia.
A outra dificuldade se refere ao balanceamento de PM (proteína metabolizável). Na mesma simulação, com a dieta com farelo de soja, conseguimos fechar o balanço de PM em 30 g/dia, mas ao fazer a substituição pelo farelo de amendoim, haverá déficit de 245 g PM/dia, e isso é bem mais complicado de acertar.
Para manter os 2 kg MS de farelo de amendoim, é preciso retirar toda a ureia, reduzir o milho e aumentar o farelo de algodão e ainda assim haverá sobra de PDR (167 g/dia), que não é muito, mas pode ser suficiente para elevar os níveis de ureia no leite acima do desejado. Dessa forma, a utilização desse subproduto pode ser interessante para vacas com produção de até 20 kg leite/dia, onde o nível de inclusão não será muito alto.
Atenção especial deve ser dada a questão da contaminação do farelo de amendoim com micotoxinas, especialmente as aflatoxinas. A ingestão de aflatoxinas pode até levar o animal à morte, e no mínimo causa redução de consumo e desempenho, dependendo da dose e da frequência de ingestão, além da idade, peso vivo, sexo e estado nutricional do animal.
Sabe-se, também, que ela pode provocar cirrose, necrose do fígado, proliferação dos canais biliares, síndrome de Reye (encefalopatia com degeneração gordurosa do cérebro), hemorragias nos rins e lesões sérias na pele, pelo contato direto.
Além disso, os produtos do seu metabolismo no organismo (principalmente o 2,3 epóxi-aflatoxina), reagem com DNA e RNA a nível celular, interferindo com o sistema imunológico do animal. Isto faz com que a resistência a doenças diminua.
O Ministério da Agricultura estabelece que o teor máximo de aflatoxinas em matérias primas destinadas à fabricação de rações para animais é de 50 ppb (partes por bilhão, ou mg/1000 kg). De qualquer forma a tolerância máxima para presença de aflatoxinas em rações para diferentes categorias animais é:
- Vacas em lactação: < 20 ppb;
- Vacas secas: < 30 ppb;
- Animais jovens e/ou sob stress: < 20 ppb.
No caso de bovinos, a dose letal (DL 50) é de 10 ppm (partes por milhão, ou mg/kg).
Ao adquirir uma partida de farelo de amendoim, esta deverá ser analisada antes da utilização em laboratório especializado em análise de micotoxinas. Dessa forma percebe-se que a utilização desse subproduto deve ser cuidadosa e criteriosa.
Quando seu preço for competitivo, pode ser uma alternativa interessante para compor rações de vacas leiteiras, desde que sejam respeitadas as restrições nutricionais e sanitárias.
Raspa e farelo de mandioca para vacas
Características nutricionais da raspa e do farelo de mandioca
Além dos cereais, algumas raízes e tubérculos também são ricos em amido, como por exemplo a mandioca. O Brasil é o maior produtor mundial de mandioca e tem se mantido nessa posição por muitos anos.
O uso de mandioca e seus subprodutos na alimentação animal vem crescendo no mundo. O mercado comum europeu é o maior centro importador de raspa e vem utilizando-a cada vez mais na composição de rações balanceadas para nutrição animal em substituição ao milho e a cevada.
Com o processamento industrial para produção de farinha e a extração de amido, gera-se resíduos sólidos como cascas, bagaços e descartes e resíduos líquidos como a água de lavagem e a manipueira. Tanto a parte aérea como as raízes frescas e os subprodutos sólidos têm potencial para uso na alimentação animal.
No Brasil as formas mais comuns de utilização da raiz da mandioca para bovinos são a raspa de mandioca, que consiste na raiz picada e seca ao sol ou artificialmente, podendo ser triturada posteriormente, originando o farelo de raspa, e o farelo de mandioca, originado após a segunda peneiragem do processo de extração da fécula.
O farelo de mandioca tem um aspecto grosseiro, por conter o material mais fibroso da raiz. Apesar de rico em amido, seu teor deste nutriente é inferior ao da raspa. O teor de amido na matéria seca varia entre 72 a 91% na raspa de mandioca e entre 60 a 65% no farelo de mandioca.
O amido da mandioca diferencia-se consideravelmente do amido do milho. Enquanto no milho, a amilopectina representa pelo menos 70 % do amido, já na mandioca a amilopectina representa apenas 17% do amido. O amido de mandioca não apresenta matriz proteica associados aos grãos de amido. Por outro lado, apresenta altos teores de amilose.
A pesquisa considera que o farelo de mandioca caracteriza-se como subproduto de boa utilização pela microflora ruminal, com coeficiente de digestibilidade da MS acima de 61%. Esta característica é um fator positivo quando a dieta é balanceada adequadamente.
Entretanto, dietas com excesso de amido de alta degradabilidade ou deficientes em fibra efetiva, aumentam significativamente os riscos de ocorrência de baixo pH ruminal, levando a baixo teor de gordura do leite, queda no consumo e na produção de leite e incidências de laminite.
Desta forma deve se evitar a substituição total do milho ou sorgo por amido de mandioca em dietas para vacas leiteiras de bom potencial de produção. A substituição pode ser total quando a raspa ou farelo de mandioca são combinados com subprodutos como polpa cítrica, casca de soja, farelo de trigo ou de glúten de milho ou outros subprodutos com baixo teor em amido.
Outro cuidado que deve ser tomado quando do uso de mandioca na alimentação de bovinos é com relação à presença de compostos tóxicos. A mandioca contém os glicosídeos linamarina e lotaustralina, que geram o ácido cianídrico (HCN).
Este composto tóxico pode causar danos neurológicos crônicos ou até mesmo a morte do animal. O HCN liga-se ao ferro e interage com a hemoglobina para formar a ciano-hemoglobina, que impede o transporte de oxigênio para os tecidos e leva o animal a morte por asfixia.
Com base nos teores de HCN a mandioca pode ser classificada como raiz mansa ou brava. Tanto a parte aérea como as raízes contêm este composto tóxico, porém os valores são mais altos na parte aérea.
Os métodos mais eficientes de se eliminar o HCN é a secagem do material, natural ou artificialmente ou o cozimento da raiz. Entretanto, a simples exposição ao ar por 24 a 48 horas da raiz ou parte aérea é suficiente para a volatilização do HCN. Assim, os riscos de intoxicação só ocorrem com o fornecimento de parte aérea e raízes frescas, trituradas e fornecidas aos animais imediatamente após a colheita.
Desempenho de vacas leiteiras alimentadas com raspa e farelo de mandioca
Nas comparações realizadas pela pesquisa, normalmente o consumo e os componentes do leite não são alterados. Por outro lado, a produção de leite pode ou não ser afetada, conforme mostram as Tabelas 13 e 14.
Tabela 13. Efeito da degradabilidade de fontes de amido no consumo de matéria seca e na produção e composição do leite.
Fonte: Pires (1999)
Médias seguidas de letras distintas nas linhas indicam diferenças significativas (P<0,05).
M310 = milho floculado a 310g/l; M360 = milho floculado a 360 g/l; MMF = milho moído fino; MMG = milho moído grosso; EPM = erro padrão da média.
Tabela 14. Valores médios de produção e composição de leite em comparações entre amido de mandioca combinado com milho e polpa cítrica.
Fonte: Scoton (2003).
T1= milho; T2 = milho + polpa cítrica; T3 = polpa cítrica + farelo de mandioca.
Farelo de trigo para vacas
Características nutricionais do farelo de trigo
Da produção da farinha de trigo para consumo humano resultam vários subprodutos, dentre eles o farelo, o gérmen e frações de aleurona do grão. Todos estes subprodutos são adequados para a alimentação animal, porém apenas o farelo de trigo tem importância comercial no Brasil.
De cada tonelada de trigo processado, 70 a 75% é convertida em farinha e o restante, 25 a 30% é transformada em subproduto com uso potencial na alimentação animal.
Como o objetivo do processamento industrial é obter a farinha – esta basicamente constituída por amido – o farelo de trigo concentra quase a totalidade dos minerais e vitaminas dos grãos, com teores relativamente constantes.
A Tabela 15 apresenta a composição bromatológica do farelo de trigo. Sua proteína apresenta alta degradabilidade, e o alimento como um todo apresenta alta degradabilidade inicial quando comparado com outros subprodutos.
Sua fibra apresenta efetividade mediana quando comparada com as forragens, porém mais alta que a maioria das fibras dos alimentos concentrados.
Tabela 15. Composição bromatológica média do farelo de trigo.
Desempenho de vacas leiteiras alimentadas com farelo de trigo
A literatura é carente em dados de comparação do farelo de trigo com outras fontes energéticas, especialmente o milho. Apesar de ser grandemente empregado na alimentação de gado de corte, a quantidade de farelo de trigo que pode ser usada nas rações de vacas leiteiras ainda não está totalmente definida.
Frequentemente a quantidade usada é limitada a ¼ do concentrado, por questões ligadas a palatabilidade e ao desempenho animal. Com relação à palatabilidade, a peletização ameniza este problema em misturas com altas quantidades de farelo de trigo.
Por causa da alta digestibilidade, o farelo de trigo tem sido usado principalmente para substituir grãos de cereais. É comumente usado como fonte de energia e proteína em concentrados comerciais para vacas em lactação.
A energia contida no farelo de trigo é similar à contida nos grãos, entretanto, a energia está na forma de fibra digestível e não na forma de amido. A proteína bruta do farelo de trigo é extensivamente degradada no rúmen e promove poucos aminoácidos para o abomaso do que outras fontes de subprodutos de alta energia. Entretanto, a aparente baixa energia contida no farelo de trigo comparado com o milho é contrabalançada pela variação benéfica na ingestão de forragem e/ou digestibilidade.
O consumo de vacas alimentadas com farelo de trigo substituindo o milho em até 60% tende a ser igual ao observado nas dietas controle, formuladas com base em farelo de soja, milho moído e silagem de milho.
Por outro lado, em relação ao glúten de milho e a casca de soja, o consumo tendeu a ser diferente. Entretanto, quando o farelo de trigo substituiu substancialmente a forragem (15%), houve aumento no consumo.
Vacas que recebem dieta com farelo de trigo podem apresentar maior concentração ruminal de amônia do que vacas recebendo dieta alta em forragem. A concentração foi sempre acima de 11 mg/dL, sendo adequado para síntese de proteína microbiana e digestão do alimento. Também, a digestibilidade do nitrogênio aumentou de 55 para 61,9% quando o farelo de trigo esteve presente na dieta.
Em substituição ao milho, a produção de leite se manteve inalterada com a utilização de farelo de trigo em até 45% do concentrado. Quando a inclusão foi entre 45 e 60% a produção de leite reduziu. Em combinação com glúten de milho e casca de soja com dois níveis de farelo de trigo na dieta, a produção de leite foi mantida, embora a teor de gordura tendeu a diminuir.
O teor e a produção de gordura do leite aumentaram linearmente à medida que se aumentou a proporção dos subprodutos farelo de trigo, grãos destilados e caroço de algodão, associados a diferentes níveis de milho de alta umidade. Entretanto, a maior percentagem de gordura do leite foi observada quando se forneceu dieta sem subprodutos e com baixo teor de milho de alta umidade.
Por outro lado, outros estudos não observaram efeito sobre a produção e composição do leite em dieta contendo 22,38% de farelo de trigo com igual quantidade de casca de soja, farelo de glúten de milho ou 34,5% de milho moído. Alguns estudos demonstraram tendência para maior teor de gordura para vacas consumindo casca de soja em relação ao farelo de trigo. A lactose e os sólidos totais desengordurado tendem a serem maiores para a dieta com farelo de trigo.
Em estudo recentemente conduzido na Esalq (Tabela 16), observou-se que a substituição dos grãos de milho pelo farelo de trigo em dietas de vacas leiteiras em confinamento, produzindo em torno de 30 kg/leite/dia, com o nível mais alto de inclusão, foi desvantajosa.
No entanto, no nível intermediário de substituição observou-se aumento na produção de leite, sem alteração nos parâmetros de composição do leite. Neste caso, quando o custo de aquisição do subproduto for competitivo em relação ao milho, sua utilização pode ser uma alternativa interessante em sistemas de produção de leite.
Tabela 16. Desempenho de vacas leiteiras recebendo farelo de trigo na dieta.
Fonte: Pedroso et al. (2005).
TRG 0= 20% milho moído fino; TRG 10= 10% milho moído fino + 10% farelo de trigo; TRG 20 = 20% farelo de trigo; Pr>F= probabilidade de haver efeito significativo entre os tratamentos; EPM= erro padrão da média; LCG 3,5= leite corrigido para teor de gordura igual a 3,5%; IMS= ingestão de matéria seca; NUL= nitrogênio uréico no leite. Pr>F= quando os números na coluna linear forem menores que 0.05 significa que existe diferença entre tratamentos (letras diferentes na linha).
Quando a palatabilidade não é problema, o farelo de trigo pode ser incorporado facilmente nas dietas de ruminantes, desde que seja viável economicamente. Porém, quando utilizado em grandes quantidades, o desempenho dos animais diminui.
Portanto, as vacas alimentadas com dietas contendo grandes quantidades de farelo de trigo poderão ser beneficiadas de adicional proteína não degradável no rúmen, especialmente durante o início da lactação. De maneira geral, o farelo de trigo pode constituir até 45% do concentrado ou 25% da dieta, sem afetar a produção e a composição do leite.
Na Tabela 17 é apresentado o resultado de um estudo realizado com vacas mantidas em pastagens tropicais manejadas no sistema rotacionado. Observa-se que a utilização de farelo de trigo não afetou a produção e composição do leite.
Tabela 17. Produção e composição do leite de vacas alimentadas com diferentes quantidades de farelo de trigo no concentrado.
Fonte: Martinez et al. Dados não publicados.
Caroço de Algodão para vacas leiteiras
Características nutricionais do caroço de algodão
O caroço de algodão (Tabela 18) é um subproduto do beneficiamento do algodão em caroço para extração da fibra de algodão. Este subproduto é disputado pela indústria moageira para a extração de óleo e produção de farelo e por pecuaristas para o fornecimento aos animais na forma integral. O beneficiamento de 100 kg de algodão em caroço resulta em 39 kg de pluma, 61 kg de caroço.
Tabela 18. Composição do caroço de algodão.
O caroço de algodão é um alimento com características particulares, pois contém alto teor energético característico de alimentos concentrados ao mesmo tempo em que é rico em fibra efetiva, comum aos alimentos volumosos. Além desses nutrientes o caroço é boa fonte de proteína e rico em óleo e fósforo, conforme apresentado na Tabela 18.
O alto teor em óleo do caroço, ao mesmo tempo que confere alto valor energético, impõe limites à sua inclusão na dieta, uma vez que a fermentação ruminal e o crescimento microbiano podem ser afetados negativamente por teores elevados de gordura insaturada no rúmen. Outro fator importante a se considerar é o alto teor em gossipol do caroço e do farelo de algodão.
Desempenho de vacas leiteiras alimentadas com caroço de algodão
Os ácidos graxos dos lipídios contidos no caroço do algodão quando em doses altas no rúmen, prejudicam a atividade fermentativa de bactérias celulolíticas e fungos. A pesquisa relata que o número máximo calculado para a população de bactérias totais foi alcançado com 22% de caroço de algodão na dieta (base seca), com decréscimo a partir de 23%.
Entretanto, em trabalho conduzido na Esalq, não se observou efeito negativo da inclusão na dieta de 34% de caroço de algodão no teor de gordura do leite. Isto sugere que não houve um efeito tóxico acentuado do alto teor de gordura na dieta com 34% de caroço na digestão de fibra, não reduzindo a digestibilidade da dieta, ao contrário do que ocorre quando se fornece igual quantidade de lipídios na forma livre.
A maioria dos trabalhos mostrou que ocorre redução no consumo com inclusão de caroço de algodão nas doses de 12 a 34% da MS da dieta em comparação com a dieta sem caroço. Apesar desta redução no consumo de MS, o consumo de energia não foi reduzido, em função do teor energético do caroço.
Em contrapartida, também se pode encontrar relatos de estudos onde não encontraram efeito no consumo de MS de vacas em lactação quando incluíram caroço de algodão na dieta nos teores que variaram de 0 a 30% da MS da dieta.
Doses intermediárias de caroço de algodão geralmente não afetaram a produção de leite, ao passo que em alguns estudos, doses elevadas, acima de 25% da MS, reduziram a produção. Outros estudos, entretanto, mostraram maior produção de leite corrigida para 4% e para 3,5% de gordura com o fornecimento de caroço de algodão.
Na maioria dos trabalhos houve aumento na produção de leite corrigida para 4% de gordura com a inclusão de caroço de algodão nas dietas. Em grande parte dos trabalhos observou-se queda na porcentagem de proteína do leite, mas devido ao pequeno aumento da produção de leite, houve pouca diminuição na produção total de proteína. Por outro lado, não relataram variações significativas nos teores de proteína do leite com o fornecimento de caroço de algodão.
Os resultados encontrados na literatura em relação ao teor de gordura do leite são controversos. De uma compilação de 13 estudos, nos quais a inclusão de caroço de algodão na dieta foi entre 100 a 300 g/kg, o teor de gordura do leite aumentou em oito dentre 13 experimentos, entretanto, somente em quatro o aumento foi significativo em relação à dieta controle.
Outro aspecto que tem sido relatado por afetar as respostas à suplementação lipídica é o tipo de volumoso utilizado. Em geral, em dieta com silagem de milho, a suplementação com lipídios ativos no rúmen, é questionável, pois muitos experimentos não têm obtido resultados favoráveis.
Em alguns trabalhos ocorreu aumento na produção de leite, mas queda na porcentagem de gordura do leite, ou manutenção da produção de leite e decréscimo na porcentagem de gordura com a inclusão de caroço de algodão na dieta. Por outro lado, quando o caroço de algodão foi incluído em dietas de feno de alfafa, houve aumento na porcentagem de gordura do leite e na produção de leite.
No Brasil, três estudos avaliaram a adição de caroço de algodão em teores crescentes para vacas leiteiras, conforme se observa nas Tabelas 19, 20 e 21.
A Tabela 19 mostra que o caroço não reduziu a produção de leite e aumentou o teor de gordura do leite. No estudo apresentado na Tabela 19, as vacas foram alimentadas com silagem de milho como fonte de volumoso. As produções de leite foram máximas com as doses intermediárias de caroço de algodão. A inclusão de 24% reduziu o consumo e a produção de leite das vacas.
Tabela 19. Teores crescentes de caroço de algodão para vacas leiteiras.
Médias na mesma coluna, seguidas de letras diferentes diferem pelo teste de Tuckey (P<0,05) Fonte: Martinez & Thomazin (1998)
Tabela 20. Efeito do caroço de algodão no desempenho de vacas leiteiras.
1- Erro Padrão da Média. Fonte: Fernandes et al., (2000).
Tabela 21. Produção e composição do leite de vacas alimentadas com cana-de-açúcar e caroço de algodão.
Fonte: Martinez et al. (dados não publicados)
Valores seguidos de mesma letra na linha não diferem entre si pelo teste de Tukey a 0,05.
1 – Produção de leite (3,5% de gordura) = 0,4324*PL(kg)+16,216*gord(kg) (Tyrrel & Reid, 1965).
2 – Concentrado com 17% de caroço de algodão com energia para produzir 18 litros de leite.
3 – Concentrado com 17% de caroço de algodão com energia para produzir 21 litros de leite.
4 – Erro padrão da média;
5 – Probabilidade.
No estudo de Fernandes (Tabela 20) pode-se observar que à medida que se aumentou o teor de caroço na dieta, houve uma tendência em reduzir a produção de leite. Por outro lado, o teor de gordura aumentou, fazendo com que a produção de leite corrigida não fosse diferente.
No estudo da Tabela 21, conduzido na Esalq, os autores avaliaram a inclusão de doses crescentes de caroço de algodão para vacas alimentadas com cana-de-açúcar como fonte de volumoso. A inclusão de 34% de caroço de algodão na dieta com cana-de-açúcar resultou em menores produções de leite, gordura, proteína, lactose e sólidos totais, bem como menores teores de lactose.
Quando se adicionou 17% de caroço, a produção e a composição do leite não diferiram da dieta controle. O teor de nitrogênio ureico do leite foi maior na dieta com 34%, intermediária nas dietas com 17% e menor nas dietas sem caroço de algodão.
A produção foi afetada quando se substituiu o milho pelo caroço de algodão (Tabela 22) para vacas em pastejo.
Tabela 22. Produção e composição do leite de vacas alimentadas com diferentes níveis de caroço de algodão no concentrado e pastejando capim elefante, durante a estação chuvosa.
Fonte: Martinez et al.
Dados seguidos de mesma letra na linha não diferem entre si pelo teste de Tukey a 0,05.
1Produção de leite corrigida para 3,5% de gordura; PL(3,5%) = 0,4324*PL(kg)+16,216*gord(kg) (Tyrrel & Reid, 1965).
A produção de leite diminuiu, provavelmente, pela menor eficiência do microbiota ruminal, comportamento evidenciado pelo efeito significativo no aumento da concentração de ureia no leite. Na dieta com 21% de caroço de algodão, o caroço substituiu completamente o farelo de soja, fonte de proteína verdadeira de alta qualidade. A proteína do caroço, por sua vez, é de alta degradabilidade ruminal.
Ao somarmos a isso a redução no teor de amido na dieta com 21% de caroço, pode-se concluir que faltou energia para a utilização da proteína, aumentando assim a ureia no leite. A tendência observada para o teor de proteína do leite retrata bem esta alteração na qualidade da proteína fornecida para as vacas.
Outro fator que pode ter colaborado para a redução na produção de leite, produção de leite corrigida e aumento na concentração de ureia, é uma provável redução no consumo de matéria seca.
Uma vez que o consumo de concentrado era individual e em quantidade fixa, a provável variação no consumo seria única e exclusivamente de forragem, tornando a dieta ainda mais rica em proteína e desbalanceada em termos de energia, principalmente em precursores gliconeogênicos. Isso também explicaria a redução no desempenho, aumentos nas concentrações de ureia e tendência para redução nos teores de lactose do leite.
Observação: este texto é proveniente de um compilado de artigos publicados pelo autor (Junio Cesar Martinez) no MilkPoint.
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Parte deste texto foi adaptado de J.W. Schroeder, NDSU Extension dairy specialist, publicado em www.thedairysite.com/
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