Ajuste a taxa de lotação
Para começar a nossa conversa, vamos definir dois termos muito utilizados na pecuária de corte, mais especificamente quando falamos em sistemas de produção de bovinos a pasto: taxa de lotação e capacidade de suporte da pastagem.
A taxa de lotação pode ser definida pelo número de animais – ou unidades animais (1 UA= 450 kg PV) –, dividido pela a área pastejada. Por exemplo: se tivermos uma área de 50 hectares, com 300 cabeças, a taxa de lotação será de 6 cabeças por hectare. Já a capacidade de suporte é definida como: a máxima taxa de lotação que uma determinada área aguentaria, sem comprometer o desempenho dos animais em um determinado período de tempo, respeitando o ecossistema pastoril. Nesse sentido, a capacidade de suporte pode variar ao longo do ano, em função das mudanças climáticas – precipitação, temperatura, horas de luz –, tipo do solo, espécie forrageira e nível de adubação.
Na realidade brasileira, é muito comum observarmos cenários em que a taxa de lotação está acima ou abaixo da capacidade de suporte da pastagem, o que pode resultar em problemas de sub-pastejo ou super pastejo.
No caso do sub-pastejo, a taxa de lotação está abaixo da capacidade de suporte do pasto (menos animais por área), permitindo que o animal selecione as partes mais nutritivas das plantas e apresente maior consumo, o que resulta em maior ganho individual e menor ganho por área (Figura 1). Nesse caso, o acúmulo e o excesso de forragem pode comprometer a estrutura do pasto, resultando em desperdício.
Por outro lado, no super pastejo, a taxa de lotação é mais alta do que a capacidade de suporte, assim, como a “pressão de pastejo” é maior, o animal não consegue selecionar as melhores partes da planta e gasta mais tempo para pastejar – o que reflete na redução do consumo –, comprometendo o desempenho individual dos animais. Precisamos tomar muito cuidado ao explorar o ganho por área a partir do aumento da taxa de lotação, uma vez que, a partir de certo ponto, o consumo de forragem pelo animal é comprometido de tal forma que faz com que o ganho por animal e por área caiam (Figura 1).
O ajuste da carga animal – taxa de lotação – a ser trabalhada é uma importante ferramenta para o manejo da pastagem. Quando pensamos nesse fato, devemos ter em mente que estamos buscando potencializar o ganho de peso de cada animal, explorando também o máximo ganho por área (faixa ótima de pastejo).
Entendendo o pastejo
Você já parou para observar como os bovinos pastejam?
Eles fazem um movimento de “envolver” as folhas com a língua, puxam e cortam com os dentes. Sendo assim, sabendo que os animais em pastejo buscam se alimentar de folhas, quanto mais fácil for sua apreensão, melhor será a formação do bocado do animal, refletindo em maior eficiência de pastejo. Sabendo que o consumo está relacionado com o desempenho, quanto melhor for a colheita de forragem, maior o desempenho dos animais.
Um ponto importante que deve ser levado em consideração é o ajuste no pastejo dos animais, de modo a garantir um número mínimo de folhas residuais para que a planta consiga se reestabelecer. Nesse caso, a planta precisa ter uma quantidade de folhas para captar luz e realizar fotossíntese – processo dependente da luz – para produzir energia e crescer. Assim, para garantir a persistência da pastagem é preciso entender a fisiologia da planta, respeitando seu limite para que a rebrota não seja comprometida.
Para que tudo isso que falamos até o momento seja válido e nos auxilie na colheita de forragem de forma eficiente, devemos considerar o método de pastejo adotado: lotação rotacionada ou lotação contínua.
Lotação rotacionada
Na lotação rotacionada, a área total que será pastejada é subdividida em piquetes menores, promovendo momentos de pastejo e de descanso em cada subdivisão – dessa forma, as plantas passam por períodos em que poderão se recuperar e rebrotar novamente.
Para saber em qual momento os animais serão trocados de piquete, podemos utilizar como referência a altura da pastagem – altura de entrada e altura de saída.
Quando manejamos a pastagem pela altura, priorizamos o alongamento das folhas, permitindo que exista uma máxima área possível de captação de luz – importante para o processo da fotossíntese – sem sombrear e prejudicar as folhas mais abaixo.
Essa captação da luz é conhecida como interceptação luminosa (IL), sendo o ideal uma IL de 95%, pois temos nesse momento – na massa produzida – o máximo acúmulo de folhas verdes. A partir desse ponto começa ocorrer o acúmulo de outros componentes – colmo, inflorescência e material senescente – que via de regra não são consumidos pelo animais, além de serem estruturas que atrapalham e diminuem a eficiência de pastejo.
Medir a luminosidade que a planta está conseguindo captar não é um procedimento muito prático de se fazer no campo, por isso estudos foram desenvolvidos e demonstraram que é possível relacionar o índice de luminosidade com a altura, e ainda estimar as alturas ideais de manejo para diferentes espécies forrageiras (Tabela 1).
Tabela 1: Altura de entrada e saída de diferentes forrageiras.
Uma grande vantagem que podemos enxergar na lotação rotacionada é o fato da colheita da forragem ocorrer de forma mais eficiente (normalmente observamos eficiência de pastejo entre 60 e 80%), uniforme e com melhor aproveitamento.
Um ponto a ser destacado no método de lotação rotacionada é o fato de que o ganho de peso por animal tende a ser menor, se comparado ao método de lotação contínua (bem manejado) nas mesmas condições de forragens, uma vez que, em lotação rotacionada, a capacidade de seleção de alimento é menor devido a maior competição entre os animais. Aqui, a suplementação aparece como uma excelente ferramenta para maximizar o ganho de peso por animal – através do efeito substitutivo e/ou combinado – e assim aumentar o número de arrobas por hectare.
Como é possível perceber, o período de ocupação e de descanso na nossa conversa está baseado em altura e não em dias fixos, como costumamos ver com frequência no campo. O manejo por dias fixos pode funcionar bem nas propriedades, porém ele provavelmente limitará a eficiência do sistema. Isso porque esse manejo não leva em consideração – por exemplo – uma desfolhação mais severa, ao ponto que a planta precise de mais dias do que o fixado para se recuperar; ou uma desfolhação mais leve, não necessitando assim de tantos dias quanto o fixado, ou ainda, as diferenças climáticas nos diferentes ciclos de pastejo. Em outras palavras, o manejo deve considerar e respeitar o crescimento da planta e a quantidade de animais disponíveis para colher, e não os dias que definimos.
A definição da quantidade de forragem disponível ao pastejo pode ser feita a partir do seguinte cálculo: quantidade de forragem (kg MS/ ha) na altura de entrada dos animais menos a quantidade de forragem (kg MS/ ha) na altura de resíduo. Como o período de ocupação é curto, não se considera a taxa de crescimento da forragem nesses dias.
Lotação contínua
Diferente da lotação rotacionada, nesse método de pastejo os animais têm acesso livre a toda área que será pastejada, não havendo alternância entre dias de descanso e dias de ocupação.
Como já apresentado, a lotação contínua – desde que bem manejada – pode possibilitar maior ganho de peso por animal, em comparação à rotacionada, devido a maior possibilidade de seleção e consumo daquilo que será ingerido.
Nesse tipo manejo, temos um menor controle sobre a desfolha e, se mal conduzido, favoreceremos o comprometimento da estrutura do pasto, o que resulta em menor eficiência de pastejo – entre 30 e 50%. Devido aos problemas de ajuste de lotação observados com muita frequência no dia a dia do campo, a lotação contínua é traduzida como um sistema extensivo de produção (baixa lotação e baixo ganho de peso).
A grande dificuldade em ajustar a lotação no sistema de lotação contínua reside na variação da taxa de crescimento da planta ao longo do tempo. Essa medida não é simples de ser executada e está diretamente relacionada às mudanças climáticas. Durante o período das águas, podemos observar em pastos de braquiária, por exemplo, uma variação na taxa de crescimento de 30 a 120 kg MS/ ha/ dia, ilustrando a dificuldade de ajuste de lotação. Na seca, como o crescimento da planta é praticamente nulo, o ajuste é mais simples e, nesse caso, o cálculo deve ser feito como na lotação rotacionada, no entanto, o período de ocupação seria o número de dias que duraria a seca.
Para melhorar o manejo em lotação contínua da pastagem, uma estratégia que pode ser adotada é trabalhar com lotes e áreas menores. Nesse caso, temos observado – na prática – melhor uniformidade de pastejo.
Ajustando a taxa de lotação
Já vimos em outro texto como estimar a quantidade de massa de forragem por hectare. Com esse valor em mãos, e com tudo que discutimos até o momento, podemos ajustar a taxa de lotação.
O primeiro passo é definir o consumo do animal. Esse é um ponto complicado, uma vez que, não é fácil estimar o consumo de bovinos mantidos em pastejo, visto que o consumo desses animais irá variar em função da qualidade e características físicas da forragem, como já discutimos. Normalmente, adotamos um valor de consumo de matéria seca de 2% do peso vivo (PV) para animais em pastejo. Para exemplificar, no caso de um animal com peso médio de 300 kg, a demanda de consumo de matéria seca, nesse caso, seria de 6 kg MS/ animal/ dia (300 kg x 2% PV). Pensando em um manejo por lotação contínua, durante a seca, com duração de 120 dias, temos que a demanda por animal é de 720 kg de MS (6 kg MS/ dia x 120 dias) durante o período.
Se assumirmos uma massa de forragem disponível para pastejo de 5.000 kg MS/ ha e uma eficiência de pastejo de 30%, temos que a forragem consumida pelos animais será de 1.500 kg MS/ha (5.000 kg MS/ ha x 30%). Sendo assim, visto a quantidade de forragem que será consumida (1.500 kg MS/ ha) e a demanda de forragem por animal (720 kg MS), calcula-se a lotação, que nesse caso, seria de 2,08 animais/ ha (1.500 kg MS/ ha ÷ 720 kg MS).
Importante destacar que, dentro dos métodos de pastejo, podemos optar ainda em trabalhar com a taxa de lotação fixa, na qual a quantidade de animais não muda durante todo o ciclo de pastejo; ou com a taxa de lotação variável, em que o número de animais varia de acordo com as condições da pastagem. Trabalhar com a taxa de lotação variável é mais complicado do ponto de vista operacional, pois exige outras áreas para alocar os animais que serão retirados do sistema.
Lembre-se:
“Se você não pode medir, não pode gerenciar”, Peter Drucker.
Cada fazenda é uma realidade, então o ideal é que todas as decisões se baseiem na sua realidade e nos dados que você tem na mão.
A suplementação pode ajudar a aumentar a taxa de lotação e ser uma excelente ferramenta, quando a intenção é o ganho por área, além de ajudar a corrigir problemas quando houver falhas no manejo das pastagens.