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Cana-de-açúcar: uma cultura de sucesso para a economia brasileira

É difícil encontrar alguém que nunca tenha visto uma plantação de cana-de-açúcar (Saccharum officinarum) em algum momento da vida. Os canaviais estão espalhados por quase todo o território nacional e a produção da cana-de-açúcar brasileira é a maior do mundo. 

A cana-de-açúcar há mais de 500 anos movimenta a economia brasileira. O setor sucroalcooleiro é responsável por 2% do produto interno bruto (PIB) nacional, seja para a produção de açúcar ou de álcool (etanol) como para a exportação desses produtos.

Cana-de-açúcar e o nosso cotidiano

Quando se fala em produtos da cana-de-açúcar, os primeiros produtos que nos vêm à cabeça são o açúcar e o álcool. O açúcar está em quase tudo o que consumimos, e faz parte do nosso cotidiano desde sempre.

E, em tempos de coronavírus, o álcool se tornou um acessório indispensável. O que já era comum em nossas casas, se tornou um item de segurança sanitária. O etanol, que antes era chamado de álcool nas bombas de combustíveis, também faz parte importante da cadeia produtiva da cana-de-açúcar.

Sendo um dos biocombustíveis mais importantes, o etanol é sustentável, diminui a poluição e ajuda no combate ao aquecimento global. Isso porque é renovável, protege os solos, gera empregos e investimentos, entre outros benefícios. Além do mais, o C02 lançado à atmosfera durante o seu processo produtivo, é compensado pelas lavouras.

No entanto, nem só de açúcar e etanol vive a cana-de-açúcar. Apesar desses dois produtos serem os carros chefe de toda a produção, atualmente muitos produtos são derivados da cana e estão presentes no nosso dia a dia.

A pesquisa e desenvolvimento de energias limpas e renováveis e produtos biodegradáveis impulsionou a pesquisa com a cultura da cana-de-açúcar.  Por isso, os derivados da cana vão muito além do melaço, garapa, cachaça, açúcar mascavo e rum.

O etanol de segunda geração (etanol 2G) é um dos exemplos que cabe ser citado, a pesquisa desenvolveu técnicas de utilização de enzimas que conseguem extrair sacarose do bagaço e da palhada da cana. O etanol de segunda geração também é chamado de etanol celulósico e possibilita um incremento na produção do biocombustível, sem aumento da área cultivada.

O etanol de segunda geração, ou etanol 2G é obtido a partir da fermentação e da destilação do bagaço e da palhada da cana-de-açúcar, que são subprodutos da fabricação do açúcar e do álcool.

Isso é feito com um conjunto de enzimas que aceleram a degradação da parede celular do bagaço, liberando os açúcares que estavam contidos. Esse processo resulta na fermentação, de onde se obtém o álcool.

O nome “segunda geração” vem do fato do combustível ser obtido do que sobrou, após a extração principal do caldo de cana.

A biomassa da produção de cana também pode gerar eletricidade. A bioeletricidade, por exemplo, é a 4ª fonte mais importante da matriz elétrica brasileira. Gerada a partir da cana-de-açúcar, a bioeletricidade complementa a produção da energia gerada pelas hidrelétricas e pode ter uma maior geração durante a época de poucas chuvas, aumentando a segurança energética do país.

Pesquisa para sustentabilidade

E a pesquisa para aprimorar o uso da biomassa da cana-de-açúcar tem se desenvolvido ano após ano. No último ano foi descoberto que as raízes da cana-de-açúcar têm uma característica interessante. Durante o seu desenvolvimento as paredes das células se modificam e criam espaços cheios de ar, separando as células umas das outras. Esse processo é semelhante ao que acontece com o mamão.

Nos frutos de mamão, as células se separam e tornam o fruto mais mole e de mais fácil digestão e extração dos açúcares.

Como esse mecanismo já está presente na planta de cana-de-açúcar (nas raízes), por que não levar essa característica para o colmo, deixando-a mais fácil para ser utilizada na extração de sacarose? Os pesquisadores estão estudando quais são os genes responsáveis por essa característica.

O colmo (caule) da cana-de-açúcar é rígido e firme, de difícil compressão e extração do caldo. Além disso, várias enzimas precisam ser usadas para degradar a palha e o bagaço da cana e transformá-los em açúcares, que aí sim poderão virar etanol.

Para facilitar todo esse processo, os pesquisadores estão desenvolvendo uma variedade de cana-de-açúcar que possui as paredes mais amolecidas, a cana-papaia. Essa característica vai fazer com que seja mais fácil a extração do caldo e com grandes perspectivas do seu uso para a extração do etanol de segunda geração.

Além disso, o etanol de cana-de-açúcar gera produtos como o bioplástico, que são materiais que se degradam em poucos meses no meio ambiente, podendo ser reciclados, diminuindo o impacto sobre o meio ambiente.  

O plástico oriundo da cana tem a estrutura bem semelhante ao PET, porém, as pesquisas mostram que as emissões e o consumo de energia durante sua produção são reduzidos em até 40,5%, quando comparados ao PET.

História e expansão do cultivo da cana-de-açúcar

A cana-de-açúcar, teve sua origem na Nova Guiné e através dos séculos foi se espalhando pela Ásia. Chegou à Índia uns dois mil anos antes de Cristo e foram os gregos que levaram a planta para a Europa.

O principal fato da sua disseminação foi a existência de um vegetal que “dava mel” sem precisar de abelhas. Nessa movimentação os árabes levaram a planta da Pérsia para as costas africanas do Mediterrâneo, passando também pelo sul da Espanha, de onde os portugueses levaram a para a Ilha da Madeira.

Desde o século XVI a cana-de-açúcar é uma importante cultura para a economia do Brasil. Trazida pelos portugueses, o plantio da cana começou no litoral brasileiro, principalmente pelo tipo de solo que é encontrado nessa região.

A cultura da cana-de-açúcar foi escolhida pelos colonizadores devido ao alto valor comercial que o açúcar tinha no mercado internacional. Sendo assim, a produção de açúcar feita por aqui era quase toda exportada para a Europa, sendo privilégio das classes mais altas do continente.

Trazidas por Martin Afonso de Souza, as primeiras mudas de cana-de-açúcar foram plantadas em São Vicente, no ano de 1533. Mesmo ano em que foi construído o primeiro engenho no Brasil. Como os portugueses tinham experiência do cultivo do vegetal na Ilha da Madeira há muitos anos, logo a cana-de-açúcar se espalhou por todo litoral do Brasil, principalmente nas regiões de Pernambuco e Bahia.

Passados menos de 50 anos da introdução da cana no Brasil, o país já tinha o monopólio mundial da produção de açúcar, assegurando aos portugueses uma elevada lucratividade. Tanto que, entre os séculos XVI e XVII o açúcar produzido por aqui foi o alicerce econômico português.

Vendo todo esse sucesso português no comércio açucareiro, os holandeses resolveram invadir a então colônia de Portugal para tentar tomar o território. Essa invasão ocorreu na região do estado de Pernambuco – grande produtor e exportador de açúcar – e foi liderada por Maurício de Nassau, em 1630.

Os holandeses então conseguiram ficar por um certo tempo na região e conseguiram aprender o cultivo da cana e acumular experiências na sua produção. Foi então que em 1654, tropas portuguesas e indígenas, conseguiram expulsar os holandeses do Brasil. 

Porém, com todo o aprendizado adquirido, o povo dos Países Baixos deu início à produção da cana-de-açúcar nas suas colônias, na região do Caribe, tornando-se um concorrente de peso no mercado de açúcar para a Europa. Com isso, a hegemonia portuguesa/brasileira do açúcar foi  quebrada no século XVIII. E com a descoberta do ouro na região de Minas Gerais, um novo ciclo da economia brasileira foi iniciado.

Mesmo assim, no período do Brasil Império de (1500-1822) a renda obtida pela produção e comércio do açúcar superou quase duas vezes a do ouro e quase cinco vezes a de todos os outros produtos agrícolas juntos, como café, algodão e madeiras.

A volta da cana-de-açúcar como protagonista na agricultura brasileira

No início do século XX a região nordeste brasileira seguia como a maior produtora de cana-de-açúcar do país, concentrada principalmente nos estados de Pernambuco e Alagoas. As usinas nordestinas eram responsáveis por toda a exportação de açúcar e supriam todo o consumo dos estados da região sul/sudeste.

Foi então que, durante a Segunda Guerra Mundial as usinas do estado de São Paulo aumentaram seu potencial de produção, como estratégia para que não faltasse açúcar, visto que a produção do nordeste era transportada pelo mar e os submarinos alemães rondavam a costa brasileira, representando um risco para esse transporte.

A partir daí, nos dez anos subsequentes, a produção de cana-de-açúcar se multiplicou em quase seis vezes no estado de São Paulo, e na década de 1950 os paulistas eram os maiores produtores do Brasil.

Foi a crise do petróleo, que aconteceu no início da década de 1970 que expandiu a produção de cana-de-açúcar para outras regiões do Brasil. Em 1975, a criação do PROÁLCOOL – programa governamental de incentivo à produção de etanol para substituir a gasolina – alavancou o desenvolvimento das novas regiões produtoras. 

Com a expansão da produção agrícola da cana para o Paraná, Mato Grosso, Goiás e Mato Grosso do Sul, o Brasil deixou de produzir 300 milhões de litros de etanol para ultrapassar o montante de 11 bilhões de litros do biocombustível.

A cana-de-açúcar nos dias atuais

O Brasil é o maior produtor de cana-de-açúcar do planeta. O estado de São Paulo continua sendo o maior estado produtor, correspondendo a 55% da produção do país. Goiás é o segundo na lista dos maiores produtores, seguido por Minas Gerais e Mato Grosso do Sul. A estimativa da safra 2020/21 de cana-de-açúcar no Brasil indica produção de 642,1 milhões de toneladas do vegetal. 

Com esse volume de cana deve ser produzido o recorde de 39,3 milhões de toneladas de açúcar, posicionando o Brasil no patamar de maior produtor do mundo por dois anos seguidos. Em relação ao etanol, a estimativa da Companhia Nacional de Abastecimento (CONAB), mostra que o Brasil deve produzir 30,6 bilhões de litros, redução de 14,3% com relação à safra 2019/20.

No mundo os maiores produtores de cana-de-açúcar são o Brasil, em primeiro lugar, seguido pela Índia e pela China. A cana-de-açúcar cresce melhor em climas quentes e em regiões tropicais, portanto, a maior parte da produção está nos países do Sul da Ásia e América do Sul.

Em área colhida, o ranking é o mesmo. O Brasil é o líder com mais de 8 milhões de hectares, a Índia é o segundo com quase 5 milhões de hectares e a China o terceiro com 1,68 milhões de hectares.

Desafios e perspectivas na produção da cana-de-açúcar

A pandemia do novo coronavírus impactou todos os setores no mundo. Apesar do agronegócio ser um dos menos afetados, a crise global representa um grande desafio. Para a cultura da cana-de-açúcar, a crise deve resultar na redução da produção de etanol em 24% em relação aos níveis da safra 2019/2020. 

Além disso, o consumo do etanol foi reduzido em até 60% nos primeiros meses da pandemia. Com o isolamento social, as pessoas diminuíram a locomoção e o uso dos automóveis. A alternativa foi migrar para a produção de álcool 70%, que ajudou a minimizar os prejuízos.

Mas mesmo diante desse cenário, a produção de cana-de-açúcar tende a prosperar nos próximos anos. Tal fato é resultante, principalmente pelas crescentes práticas sustentáveis na agricultura (cana de açúcar, agricultura) e indústria. 

Até cimento para a construção civil está sendo desenvolvido a partir do bagaço da cana. Muitas pesquisas têm sido feitas para utilizá-lo como material de preenchimento em concreto, conferindo resistência adicional, reduzindo o calor, boa trabalhabilidade e características de alta durabilidade.

Em todo o mundo, a pesquisa da cultura é crescente. O investimento no desenvolvimento de novas plantas, com a ajuda da biotecnologia, tornando-as mais produtivas e eficientes no consumo de água e dos nutrientes é uma linha que vem crescendo muito.

Diante do cenário de mudanças climáticas e dos desafios de irrigação da cana-de-açúcar, os cientistas estão desenvolvendo diferentes formas de entregar variedades de cana tolerantes a períodos de seca.

Principal fonte:

Yogitha B. et al., Progress of sugarcane bagasse ash applications in production of Eco-Friendly concrete – Review. Materials Today: Proceedings, 2020.

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